Desafiadora e gratificante: a rotina de quem trabalha com crianças autistas em Natal

Quando o adolescente de 16 anos chegou com diagnóstico confirmado, trazido por sua mãe, mas sem nunca ter recebido terapias, a psicóloga Adriana Melo, de 45 anos, sabia que enfrentava um dos maiores desafios de sua carreira. O jovem, com Transtorno do Espectro Autista (TEA), não sabia falar e não conseguia realizar ações simples, como sentar ou bater palmas.

Embora esse caso específico seja o que Adriana recorda de imediato quando questionada sobre momentos marcantes, a psicóloga vive histórias assim todos os dias. No consultório da unidade especializada da Hapvida, onde trabalha, no bairro de Lagoa Nova, em Natal, ela já acompanhou mais de 500 histórias de resiliência vividas por crianças e adolescentes que, na maioria das vezes, nem sequer conhecem o significado dessa palavra.

O desafio de trabalhar com crianças e adolescentes autistas é constante, especialmente com o aumento da demanda nos últimos anos. A Organização Mundial da Saúde (OMS) estima que uma em cada 100 crianças no mundo tenha o transtorno. De acordo com o relatório anual dos Centros de Controle e Prevenção de Doenças (CDC), uma em cada 36 crianças de 8 anos é diagnosticada com TEA. Abril é o mês da conscientização sobre o autismo, também conhecido como “Abril Azul”.

Um desses pacientes é Pedro, de sete anos. O diagnóstico foi confirmado antes de ele completar dois anos, após seus pais perceberem algumas regressões no desenvolvimento e a presença de movimentos repetitivos. Deyveson Oliveira, pai de Pedro, destaca que o apoio da equipe da qual Adriana faz parte foi essencial para incluí-los no processo e transmitir segurança. Ele vê as terapias como um divisor de águas na vida dele, da esposa e de seu filho.

“Através das terapias e das intervenções precoces, conseguimos resultados surpreendentes. Estávamos sem perspectivas, mas com esse trabalho cuidadoso, conseguimos intervir nos pontos necessários e promover o desenvolvimento de outras habilidades, além de explorar de maneira positiva o melhor de Pedro. No caso dele, o hiperfoco e seu interesse por letras e números”, compartilha Deyveson. Pedro lê com facilidade, tem grande aptidão para o inglês e acompanha bem os colegas de turma.

Deyveson relata que a confiança foi fundamental nesse processo, uma conquista da equipe que permitiu à família relaxar, e que se estabeleceu após a demonstração de muita empatia. “Durante a pandemia, logo no início do tratamento, quando não podíamos sair de casa, eles nos ligavam para saber como estávamos e tentavam atuar da melhor forma. Foi nesse momento que tive a certeza de que realmente queriam o melhor para o meu filho”, conta ele.

Adriana explica que, apesar dos esforços individuais, a rotina de trabalho – que descreve como “desafiadora, mas gratificante”, por possibilitar a transformação de vidas – exige cooperação. “Ninguém consegue êxito sozinho”. Ela defende que o sucesso do tratamento demanda uma abordagem transdisciplinar, com múltiplos atendimentos e terapias, mas, acima de tudo, o apoio da família. Para ela, esse suporte é essencial, tão valioso que a psicóloga o classifica como “padrão ouro”.

“Se todos não estiverem alinhados, não funciona. Por isso, damos a mesma atenção aos responsáveis que damos aos pacientes. Muitos pais acreditam que o terapeuta será responsável por tudo, mas mostramos que o trabalho é coletivo e que eles também devem ser treinados para participar”, comenta Adriana, que atende principalmente crianças e adolescentes de nove meses a 17 anos.

O contato com os pais, detalha a psicóloga, começa logo após a triagem inicial, permitindo que os profissionais compreendam a subjetividade de cada paciente. Esse entendimento é fundamental para a elaboração de planos terapêuticos adequados a cada situação. Com a análise em mãos, equipes compostas por psicólogos, fonoaudiólogos, fisioterapeutas, terapeutas ocupacionais, nutricionistas, psicopedagogos e psicomotricistas trabalham de forma integrada.

Adriana lembra do caso do adolescente de 16 anos como um exemplo de superação. Ao lado da equipe da unidade, ela atuou ativamente e obteve resultados significativos em seis meses, com avanços tanto no aspecto cognitivo quanto na socialização. O diferencial, conforme conta, foi justamente a presença contínua da família. “Ainda que não tenham todo o conhecimento necessário, com a orientação adequada, é possível que ela nos ajude a alcançar grandes progressos”.

A dedicação de Adriana é um diferencial. Desde antes de se formar, ela começou a atuar como voluntária para colaborar com o desenvolvimento de crianças autistas. “É uma atividade que exige muito de nós, mas também nos proporciona muito em troca”. Alterar o curso da história de uma pessoa – ou de várias – surge, nesse contexto, como a maior recompensa.

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